segunda-feira, abril 24, 2006

As Gajas e os Gajos no Algarve – Relatório da Bluerussian

(As gajas e os gajos no Algarve.)

Por sugestão de um concorridíssimo post de um blog de seu ilustre nome Bicicleta de Recados, resolvi pôr pés ao caminho, mãos, olhos e ouvidos à obra e realizar in loco uma observação sociológica, tendente à obtenção de conclusões isentas sobre atitude das pessoas no Algarve (cingi-me a Albufeira, hélas...), nativas ou não.

A altura da Páscoa não é o melhor sample. O ambiente é maioritariamente familiar, aproximadamente 70% das pessoas que se vêem nas ruas e nas praias andam em família, quer sejam portugueses, quer estrangeiros. Vêm-se alguns grupos de malta mais desgarrada, a gozar as feriazinhas em grupos pequenos. No verão, a diversidade de grupos é muita, e há menos preponderância de grupos familiares assim tão coesos.

Seguem-se as conclusões:

1- O Algarve é o único sítio em Portugal onde se pode andar em bikini na rua (calções de banho para os homens...), sem complexos de qualquer espécie - as pessoas despem-se mais, e mais descontraidamente. Motivo: pelo calor, porque estão relaxadamente de férias, e porque estão fora do seu quotidiano normal.

2- se de dia o ambiente é descontraído, à noite a coisa muda de figura: as mulheres produzem-se mais, maquilham-se mais, investem nos modelitos que acham mais sexy (independentemente do que se ache bom ou mau gosto). Por um lado, como o ambiente é de férias, as mulheres tem mais tempo e mais vontade de se produzir; por outro lado, a concorrência da mulher estrangeira (e cada vez mais da nacional, felizmente...) é ferocíssima: elas vêm cá, sabem que isto está pejado de “machos latinos” (seja lá o que isso for), e vestem-se para “matar” . O resto da mulherada fica mais incentivada para se produzir, não vão os homens no geral, e os eventualmente seus no particular, olhar mais para as outras... Resultado: um cenário homogéneo – mini-saias, vestidos justos, decotes, brilhos, salto agulha, muita maquilhagem. Os cabeleireiros estão sempre cheios até à hora de jantar, já para não falar nas lojas de roupa.

3- Os homens, de há uns anos para cá, estão a melhorar e muito. Antes, só chamavam a atenção alguns desportistas bronzeados, com uma farpelazinha de melhor gosto, algum “cota” mais enxuto e os seguranças do Zézé Camarinha. Contavam-se pelos dedos. Agora, dá ideia que os homens perceberam que a produção também os pode favorecer, e andam por ali cheíssimos de bom aspecto... não todos, mas uns quantos (e alto aí que nem estou a considerar os pseudo-Castelo-Brancos... ah, não, tecnicamente, chamam-se metrosexuais).

4- Atitude – qualquer coisa entre o descontraído e o “anda cá meu pequerrucho”. As mulheres: julgo que bebem mais do que quando estão no seu quotidiano normal. Whisky, vodka, cerveja, as bebidas preferidas. Coktails, também, muitos. Shots, mais nas discotecas, ou em bares específicos. E porquê? Porque no dia seguinte não têm que ir trabalhar, e podem sempre ressacar pelas praias; porque o calor faz sede, e porque a malta fica bem disposta. E não se vêm muitas mulheres sem um copo na mão. Nem sozinhas... elas não têm qualquer problema em conversar com quem quer que seja, e metem-se com quem lhes interessa, sem se preocupar com as convenções sobre não falar com desconhecidos... Os homens: a mesma coisa. Até porque a bebida é sempre um bom desbloqueador de conversas: aí umas 50%, pelo menos, das abordagens masculinas têm a ver com bebidas (o velhinho “posso oferecer-lhe uma bebida” ainda resulta, por incrível que pareça...).

5- Por causa do álcool, da boa disposição, e/ou do à vontade de não ver gente conhecida (o que em Albufeira até é difícil), toda a gente participa em tudo: karaokes (os estrangeiros são sempre os primeiros, o tuga depois é que vai), pequenos concursos nos bares, etc. E dançam, fartam-se de dançar, nem que seja no meio da rua.

6- Ora, dada a convivência das mulheres algarvias com este pessoal todos os anos, há muito tempo que elas, no geral, se tornaram mais produzidas, mais vaidosas, e mais atiradiças do que a maioria das mulheres dos centros urbanos mais a norte, e isso é normal. Mesmo que se questionem os gostos na apresentação da figura, elas são capazes de chamar mais a atenção, independentemente da formação que possam ter. A concorrência apura o mercado, certo? Mesmo em termos de atitude, umas são mais cool do que outras, mas o show off, e o à-vontade consigo próprias e com os outros, especialmente com os homens, são evidentes.

7- Pena que os homens algarvios não sigam os mesmos exemplos, à escala. Continuo a achar que ainda têm muito que aprender. Há ainda muito Zézé Camarinha em versões mais recentes, e até menos interessantes. Mas no entanto, eles safam-se. Melhor que elas!!! A procura pelo latin lover (?)é muita, e os algarvios não são assim tantos.

8- Em relação à formação académica, já se pode dizer que há mesmo de tudo: mulheres com elevados graus académicos e mulheres com formação básica, têm muitas vezes as mesmas atitudes, para o bem e para o mal – a vulgaridade, ou a classe, não têm que depender directamente de um diploma. Só na base da observação, é difícil distinguir os níveis de formação, porque o mau gosto é um mal que também afecta pessoas com formação superior; e dado que no Algarve há já muito ensino superior, o nível tem subido por lá, pelo menos no papel... Em altura de férias, a regra é ter mesmo que se conversar pelo menos 2 minutos com as moçoilas, para se perceber o nível de formação.... porque só pelo aspecto, não sei se lá se chega . Nos homens é ligeiramente mais fácil de distinguir, não tanto pela farpela, mas também – e fazem-se mais difíceis, e não investem tanto na boca foleira. Esforçam-se por captar o interesse das moças pela conversa, não só pelo aspecto (ainda que quase ninguém dê muita conversa a feios, especialmente se forem burros e alarves...).

Isto tem uma grande dose de generalismo despótico, eu sei - há gente de todo o tipo, por todo o lado, no Algarve também, vivemos numa sociedade global. Mas o Algarve, quando está a bombar, passa esta imagem, e não sou a única a dizê-lo. E nem acho que seja mau. Mesmo nada. E, na realidade, coitados dos algarvios: quando a malta anda por lá na galhofa, eles têm que trabalhar.... é a vida!

sexta-feira, abril 21, 2006

Editorial do Público — Propinas

A OCDE não perdoa
José Manuel Fernandes, Editorial do Público

Muitas das soluções propostas pela OCDE não são novas, em especial na área da educação. Cabe perceber por que nunca foram concretizadas

Portugal padece há muito de um mal antigo: sabemos fazer planos, mas passá-las à prática é o diabo. "Défice de implementação", dirão os especialistas. Muita ronha e muita resistência à mudança, acrescentaremos nós, sem esquecer a instabilidade nas políticas e falta de determinação na sua concretização.
O relatório da OCDE ontem divulgado volta a confirmar este diagnóstico. Da economia à educação, quase tudo o que lá vem era conhecido, muitas das soluções indicadas até já estiveram previstas, mas... por cá seguimos mais ou menos na mesma repetindo ano após ano os mesmos relatórios salvadores.
Tomemos o caso da educação, mais focado este ano pela OCDE. Há quase oito anos, quando saiu do Ministério da Educação, Marçal Grilo garantia que o barco ainda mal tinha saído do porto, mas estava no rumo certo. Seis ministros da Educação depois (seis!) o barco continua mais ou menos à deriva apesar dos milhares de relatórios e até das bem intencionadas leis que se foram fazendo. Provavelmente o próprio Marçal Grilo o terá entretanto percebido, pois já regressou algumas vezes ao espaço público para tentar corrigir algumas orientações (recorde-se, por exemplo, o "empurrão" que deu para que fossem divulgados os rankings das escolas do ensino secundário ordenados de acordo com os resultados obtidos pelos alunos nos exames do 12.º ano e, mais recentemente, como interveio sugerindo uma maior liberdade de escolha de pais e alunos relativamente à sua escola).
Na verdade o "barco" tem levado muitos solavancos e navega num mar onde os recifes são tantos que o risco de encalhar é elevadíssimo, apesar de muitos serem os que vêm repetindo aos sucessivos comandantes para terem mão firme no leme. E seguirem algumas das recomendações que a OCDE repete neste seu relatório e que nem sequer são especialmente originais.
Aumentar as propinas no ensino superior público? Compensar esse aumento, no caso dos estudantes mais necessitados, com empréstimos reembolsáveis depois de ingressar na vida activa? Corrigir a evidente desigualdade social que o actual modelo acentua? Tudo isso já foi dito e redito por muita gente, tudo isso já foi aplicado em muitos outros países, tudo isso já foi também defendido nestas páginas. Com a falta de resultados que está à vista.
Reforçar a autonomia dos estabelecimentos de ensino básico e secundário? Responsabilizar mais os seus directores, formando-os e premiando-os em conformidade? Racionalizar a rede de estabelecimentos públicos? Os mais responsáveis também não se têm cansado de o referir, houve momentos em que se julgou que até se fariam as leis necessárias, mas a verdade é que se nalguns casos se tomam medidas certas (fechar as escolas que quase não têm alunos), noutros caminha-se em sentido inverso (como quando se insiste na colocação centralizada de professores e agora se acrescenta um mecanismo de aprovação centralizada dos livros escolares).
Pela 5 de Outubro têm passado ministros muito diferentes, alguns bem intencionados e determinados, outros nem por isso, mas a verdade é que quando se olha para aquela casa percebe-se que quem manda realmente nela é o seu monstruoso aparelho formado quase exclusivamente por professores, alguns dos quais não dão aulas há demasiado tempo. Um só número permite perceber como tudo naquela casa está invertido e tem sido feito mais em função dos interesses desses professores, e dos seus sindicatos, do que da educação: é o que indica que 93,4 por cento do orçamento vai para pagar salários, contra uma média na OCDE de 74,4 por cento. Como se costuma dizer, sigam o dinheiro e vejam onde está o poder. No Ministério da Educação a pista não engana...

Propinas no Público

Aumento das propinas no superior para financiamento mais justo e eficiente
Isabel Leiria, Público

OCDE sugere modelo de empréstimos e bolsas, já que os mais necessitados continuam a ficar de fora do sistema

O actual sistema de financiamento público do ensino superior é questionável em termos de equidade. Afinal, o dinheiro despendido pelo Estado beneficia apenas uma pequena parte da população que não só tende a ter mais posses, como virá a retirar grandes benefícios pessoais deste investimento, assegurado em larguíssima medida (90 por cento do total da despesa nacional neste nível de ensino) pela generalidade dos contribuintes, lembra a OCDE.
Por isso, recomenda-se no relatório económico sobre Portugal, as fontes de financiamento das instituições de ensino públicas devem ser alargadas, combinando orçamento de estado, propinas e associações com empresas e centros de investigação.
"Aumentar as propinas no ensino superior e, simultaneamente, desenvolver um sistema de empréstimos (talvez com a possibilidade de pagamento após a formação e entrada no mercado de trabalho) seria mais justo e aumentaria a eficiência". Até porque, continua-se, "as propinas nas instituições públicas são relativamente baixas enquanto as contrapartidas salariais para os detentores de um diploma são altas".
Os peritos da OCDE acreditam que, se os estudantes pagassem taxas de frequência mais altas, passariam a estar mais atentos à qualidade e às matérias oferecidas, exercendo assim maior pressão sobre as instituições, para que dessem respostas às suas necessidades. Além disso, os recursos adicionais permitiriam aumentar a qualidade do pessoal docente e da investigação.
Ao mesmo tempo, caberia ao Estado assegurar o apoio aos mais necessitados, através de bolsas e empréstimos. Este aspecto é crucial, sobretudo num país onde a selectividade no acesso ao superior é "mais acentuada do que em muitos outros países e a participação dos estudantes dos estratos sócio-económicos inferiores continua a ser particularmente baixa".
A OCDE lembra ainda que, apesar de cerca de um quarto dos alunos receberem algum apoio do Estado, essa ajuda mensal é, em média, "muito reduzida".

Racionalizar a oferta,
diminuir o insucesso
Apesar do investimento estatal considerável na educação superior, a despesa por aluno continua a ser baixa, comparando com a média da OCDE ou com os outros níveis de ensino. Face aos constrangimentos económicos e financeiros do país, sugerem-se intervenções no sentido de garantir ganhos de eficiência.
Como? Racionalizando a oferta, que é excessiva, pela fusão e encerramento de instituições, pelo fecho de cursos com poucos alunos e reestruturação das formações, com aposta nas áreas das ciências e tecnologias; criando "redes de conhecimento", entre universidades e politécnicos, que permitiriam "economias de escala e mais qualidade"; desenvolvendo parcerias internacionais com instituições de prestígio.
Outro dos pontos que deve merecer muita atenção das políticas públicas prende-se com as elevadas taxas de insucesso e abandono escolares. Aqui, sugere a OCDE, a solução passa pela diversificação das ofertas educativas e pela melhoria da qualidade. Desenvolver uma maior capacidade científica, autonomia e prestação de contas por parte das instituições, acompanhada de um sistema de acreditação, são passos essenciais, diz a organização.
A formação de adultos é também alvo de reparo da OCDE. Sendo um dos países onde a população activa é menos qualificada, Portugal apresenta igualmente uma das mais baixas taxas de participação da sua população activa em acções de formação (menos de 10 por cento). E quem participa são sobretudo os trabalhadores mais novos, mais habilitados e de grandes empresas.
É preciso fazer um melhor uso dos recursos educativos existentes, garantir que a formação chega a quem tem mais necessidade, designadamente através de uma maior informação e orientação sobre as oportunidades existentes, monitorizar a qualidade.
A criação de um sistema de nacional de certificação das competências (com atribuição de equivalência a estudos básicos e secundários) é elogiada pela OCDE, que lembra, no entanto, que este modelo ainda está a dar os primeiros passos.